Publicado por Jorge Santos / Joel Matos
Mad'in China
Xi'an / Bishkek 2013 (Mad'in China)
Quando entrei no aeroporto de Lisboa, no dia 30 de Maio de 2013, numa meia tarde quente, sentia-me inseguro, transportava comigo um enorme embrulho contendo uma bicicleta meio desmontada e o que eu considerava ter de coragem, a metade bastante para tentar atravessar a grande China pedalando.
Revelou ser uma tarefa para um qual ainda não me encontrava preparado, a monotonia infinita do planalto tibetano e a paz que não levava comigo no pequeno alforge, revelaram-se-me avassaladoras.
Perguntou a polícia quando entrei na área internacional do aeródromo,
- qual é o seu destino?
respondi com vigor exagerado
- para a China!
respondeu ele que para lá não iria de forma alguma
retorqui eu que sim, era sem dúvida alguma o meu destino,
respondeu ele de novo,
- não há voos entre Lisboa e Pequim
Disse-lhe finalmente que faria escala em Istambul e deixou-me passar com um ar astucioso, peculiar em todas as autoridades de todos os países.
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Ao aterrar em Xi'an de madrugada, não supunha o redemoinho de acontecimentos e contrariedades que este imenso pais me reservava, aguardava-me o táxi que me haveria de levar ao “albergue da juventude les 7 sages”.
Chovia e as ruas pareciam encantadoramente Asiáticas e fantasmagóricas junto daquele paredão escuro.
Xi'an parecia toda uma cidadela medieval sequestrada por um colosso demasiado ocidentalizado de betão, alcatrão e ferro que era o continente Asiático; hotel, aproveitado das antigas cavalariças do corpo de elite das tropas do imperador Xin, elaboração recuar o tempo no interior dos muros da cidade, for a China mostrava como verdadeiras cores, invicta e esventrada dos gloriosos e ancestrais íd e sendoida preenchido com mesmo a pestilência de um fumo horrível.
Pelo menos aqui falava-se inglês, se bem que tenho que me adaptar ao sotaque. Reconstruí a bicicleta no quarto, aos pés da cama, tomei um banho quente e mais parecia um zumbi ou uma máquina controlada por piloto automático que repousava das 20 horas de jornada. naquele colchão rente ao chão e nos únicos lençóis brancos de toda a viagem, nem os sonhos adivinhavam o meu futuro na China.
Sete da madrugada e pergunto na recepção onde posso adquirir um mapa de estradas chinesas, uma ferramenta imprescindível, senão a mais importante para continuar para o Ocidente na direção do Deserto do Taklamakan e do Quirguistão.
Apontou-me o mercado ao lado da estação não muito longe do albergue, para onde me dirigi; aqui foi a primeira noção da Ásia total que me envolveu nesta viagem, como ruas das prostitutas importunando clientes possíveis, a fealdade dos becos pejados de lixo, a pobreza extrema estampada nas feições mas na alma a nobreza própria de quem protagonizou a História da humanidade, respondiam sempre no mesmo tom e repetiam como minhas palavras quando dizia que queria comprar um “Mapa da China”, continue durante cerca de uma hora questionando os transeuntes que me pareciam saber algum inglês mas ingloriamente, nem um único termo compreendiam nem um gesto, nada …
Dado Xi'An ser uma cidade construída dentro e em volta de uma muralha quadrangular nada mais sensato me ocorreu senão seguir junto ao muro, para Oeste, talvez isso me levasse de uma forma mágica, ao meu destino próximo, a cidade de Lanzhou, pois nem o nome dessa ou de outras cidades eu era capaz de pronunciar em Chinês.
Senti-me completamente perdido no meio do “smog” e com uma vontade de voltar, de não estar ali, a alimentação futura não menos que a fome atormentava-me, o mito ocidental, que os chineses comem todo o tipo de insetos e animais deixava-me aterrorizado tanto que durante este primeiro dia decidir não comer nada para me habituar a ideia de me alimentar d'alguma coisa.
Foi agradável a visão de postal dos campos cultivados, das árvores beijando a estrada, dos praticantes de tai-chi nos jardins, ao som de diferentes instrumentos e finalmente na rota que me levaria ao Ocidente, a “Rota da Seda”
Havia pedalado pouco mais de cem quilómetros sem me dar conta do jet-leg e da fome, pareciam mais pesadas como pernas e uma bicicleta, como pequenas subidas afiguravam-se a montanhas íngremes e mochila nas costas pesava como chumbo.
Um grupo de camiões, num dos muitos locais artesanais de lavagem, fez-me pensar que talvez fosse bom provar do acolhimento deste povo, ao principio, riram-se dos meus gestos quando sugeri colocar a bicicleta dentro da galera alta e vermelha de transporte de carvão.
Fiquei contente quando o condutor me levou pela estrada, em ziguezague, sempre tentando fazer conversa, oferecendo-me tabaco, comida, bebida e o telemóvel onde a esposa ou uma filha perguntavam com umas tímidas palavras em inglês, para onde ia e o que estava fazendo na China, inclusive parou junto das bilheteiras do exercício de Terracota do imperador “Xin” para que o traduzissem questionando para onde ia eu, ficou com um ar de puro espanto quando lhes anunciei uma pretensão de atravessar a China.
Mais tarde durante a viagem com cerca de 80/100 km, pelas minhas contas, mostrei a foto de família que trazia comigo e tiva dificuldade em conseguir-lo sentido que não era para oferecer, mas recordação da família que transportava comigo quando viajava.
Como que era guardado pelos colegas, cada um que passava acenava-lhe e perguntava algo que eu entendia como sendo ”pra onde levas esse branco? ”Ou“ que faz com ele aí dentro? ”
Algumas dezenas de quilómetros depois de apeado e agradecer ao agradável motorista do camião, aconteceu o primeiro furo…
Não tardou em aparecer um jovem com cerca de 20 anos, com roupas de ciclismo, parecia um normalíssimo ocidental em fim de semana, montado numa bicicleta de montanha nova,
entendi que ia na direção de Lanzhou, transportou a câmara de ar até uma “oficina” improvisada, ali perto, junto ao passeio, consistia numa bacia com agua, alguns remendos e uma bomba de ar manual, apesar da minha insistência este chegado amigo não me deixou pagar o arranjo, me senti aliviado por isso, tinha acabado de chegar a este país (diferente de muitos outros) e ainda não confiava na honestidade que comprovaria mais tarde e me entregaria de alma e coração a estes maravilhosos povos da China .
Não nos separámos, às 48 horas seguintes, nem para respirar. Sufocava-me e penso que também ele sentia isso, pela azáfama que demonstrava em procurar alguém que falasse inglês, nas escolas básicas onde não obtinha grande ajuda, nem sequer por parte dos professores, com um inglês muito primário, apenas nas universidades universitárias manter alguma conversação com os docentes, que manifestavam uma curiosidade enorme pelo ocidente e pela minha viagem, mas apesar disso, nunca consegui compreender o meu jovem amigo, acerca do que ele desejaria comunicar-me, pensar até que não me queria como companheiro de viagem mas, quando eu me afastava propositadamente e também porque ele pedalava devagar, este pedia-me para abrandar,
Pernoitei no minúsculo “bivouac” azul, (também o meu amigo chinês transportava uma exígua tenda) no meio de fenos empilhados, numa aldeia antiga e depois de termos solicitados aos locais para descansar.
Foi uma festa para os meninos, não estavam habituados a ver estrangeiros e seguiam todos os meus gestos sem incomodarem, estava habituado noutras paragens a ser atacado literalmente por enxames de crianças, pilhado até com a indulgência dos familiares, nada disso se passava no pacatez desta China simples e rural.
No dia seguinte, muito cedo detivemo-nos numa pequena vila, apenas com uma rua bastante poeirenta, serviam-se refeições sob frondosas árvores, fui obsequiado com um pequeno almoço, servido a preceito num saco de plástico pousado uma m Málaga jamais lavada, soube bem estar sentado em plena rua sorvendo, como é habito preparado paragens, aquela sopa picante, adivinhava-se o sabor pela cor avermelhada e objetos desconhecidos, repugnantes pairando no caldo, mas foi aconchegante, tinha fome e fosse qual fosse a refeição, era bem vinda .
Adivinhavam-se as feições tibetanas em alguns peregrinos à medida que me ia aproximando do elevado “planalto”, pareciam-se com os caminhantes de Santiago de Compostela que conhecer noutros tempos, numa geografia de rostos distintos.
Era noite quando chegámos à cidade de Lanhzou descomunal e de novo à norma, o caos não afeta exclusivamente automóvel, as ruas apinhadas de gente que me olhavam como se fosse eu um extraterreno saído dalgum “OVNI” em talhe de bicicleta.
Esta, como todas as cidades chinesas que conheci, parecia cintilar de tanta luz e néon vista de longe, reparei nos rostos franzinos dos camponeses encostados aos vidros embaciados dos autocarros, boquiabertos com tanta ostentação, diz-se por aqui “para inglês ver”, neste caso será mais para uso doméstico, porque nas ruas detrás, no mais lugar central da cidade mas escondidas aos forasteiros, eram o mesmo amontoado de escombros, lixo, falta de esgotos e ruas sem asfalto, cada morador tem de usar lanterna para não cair numa vala cheia de ratos, num buraco onde é queimado diariamente o lixo ou num vazadouro de esgoto caseiro.
Exibiu-me aos estranhos amigos “teenegers” e a uma irmã que felizmente falava bem inglês, trabalhava na versão chinesa do Kentucky Fried Chicken, eu sabia previamente não haver esta marca de franchising na China, mas a imitação era perfeita, além disso eu detestava frango ,
Disse-me que não viviam juntos, depressa compreendi porquê, os pais eram separados e o rapaz ficou no “lado negro da lua”, com um pai sempre alcoolizado, numa casa de duas divisões e extremamente suja, discutiram durante algum tempo, ela tentava, penso eu, convencer o irmão a procurar um hotel para mim em lugar de me levar para casa dela,
A resposta foi arrogante no primeiro hotel onde entrou obter informações - não pode de forma alguma, ficar em hotéis para Chineses, foi então procurar um hotel exclusivamente para estrangeiros, saiu impressionada e com as mãos na cabeça, o preço por cada noite era escandaloso, 350 yuans (35 euros) quase o terço do salário de um mês de trabalho na China.
Resolveram que ficaria na casa do pai dele, ofereceram-me jantar numa esplanada em plena rua, espetadas de carne de cão no churrasco, acompanhadas de cerveja, muita cerveja, sentiu-me vulnerável e ainda mais bebendo assim tanto, depois de um dia inteiro em jejum, mas confiei neste bando de jovens que anunciavam os tradutores dos telemóveis como sendo Hackers (perguntei-me se entendreiam o significado do termo)
Viviam sozinhos, em pequenas lojas de 4/5 metros quadrados apenas com um computador, um LCD na parede, caixas usadas de comida pré-cozinhada, amontoadas a um canto, despedimo-nos tarde e fui para a casa do meu anfitrião.
Ainda tentei lutar contra o sono, estava sozinho e indefeso numa casa anónima, numa incógnita cidade do interior da China, onde poderia desaparecer sem deixar rasto.
O rapaz dormiu no sofá e cedeu-me uma cama coberta de uma esteira em bambu, muito mais tarde é que descobri que a cama tinha duas utilizações, era usada como mesa quando vazia dos moradores noturnos, sendo assim, sem retirar a esteira, eu dormira em cima da mesa.
Acordei cedo e foi como um bálsamo a partida de novo e sempre para Ocidente, desta vez em comboio como me foi “imposto” pela irmã do jovem que me cedeu a cama para dormir, fui em direcção a Xining, capital da província de Quighai e terras dos grandes lagos sagrados e salgados.
Fez-me esta prometer que não iria de bicicleta subir montanhas tão íngremes que se avistavam do cento da cidade, dizia, alistava os penedos escuros, ao que eu concordei, faltavam, (pensava eu,) muitos quilómetros e nada melhor que o conforto de um comboio.
Os jovens são imensos na China e o vagão estava apinhado deles, viciados em telemóveis, ainda mais que no ocidente, d'entre estes salientes-se especialmente um pelo entusiasmo radiante e a facilidade com que chamava a atenção das belas raparigas, de quase todas elas, Penso que se conheciam mas mais tarde descobri que eram apenas companhia de ocasião.
Quando saí do comboio veio correndo ao meu encontro e coloca-me um pin com uma ave pernalta desenho dizendo ser da “sua” organização, que eu soubesse todas as “organizações” na China são governamentais, mas não voltei a pensar no caso, não fosse voltar a encontra-lo por mais duas vezes nos cerca de 2.500 quilómetros que palmilhei deste país, coincidências? …
A vila de Daotanghe situa-se numa encruzilhada de duas estradas, sempre com uma praça tradicional e monumental, uma praça ornamentada com alguma arte arrogante, regimental e naturalmente desprovida de sentimentos.
As vendedoras na rua puxavam-me os cabelos das pernas quando passava, apeado da bicicleta, junto ao lago Quinghai, uma jovem vem ter comigo e passa-me a mão pela cara para sentir a minha barba eriçada, algo que não estavam habituados a ver ou sentir, nem eu a ser assediado desta forma por quem recusava um simples beijo de despedida quando eu por vezes tentava ser simpático com o sexo oposto.
Nessa noite fico num hotel mas inutilmente procuro pelo chuveiro ou o banheiro de que tanto pública, o quarto tinha apenas o tamanho do minicolchão e do meu corpo semiencolhido, na casa de banho havia uma pirâmide fecal petrificada e nauseabunda sob o respetivo buraco, nas traseiras da aldeia onde toda a população está definida como necessidade quase a céu aberto.
Se houvesse ascendido por uma estrada interminável desenhava-se para os dias seguintes o pior cenário possível, descobri tarde demais que eu estava enganado no itinerário por não ter comprado mapa, em vez de usar o percurso da direita (Oeste) em direção ao lago Quinghai , atravessei algumas centenas de Quilómetros de montanhas para Sul (para Gonghe), mais outra poeirenta e desagradável cidade.
Continuei por dias consecutivos, dormindo em “bivoac” e pedalando por subidas abruptas em altitudes de perto de 4.000 metros, agarrado à traseira de camiões, carregados de asfalto e pedra, para a construção das imponentes vias de acesso vitais a China, nem tanto ao povo “Uigur”, maioritário ainda na província de Xinjiang (por poucos anos) auto-estradas sem tráfego significativo, a não ser tanques de guerra, carros antimotim e policia, muitos policias…
A fresquidão das madrugadas e os espaços sem termo do altiplano eram um calmante para a alma, embora de resto, os dias quentíssimos, tendo como única sombra a que eu próprio criava, os filhos do tráfego, as omnipresentes buzinadelas nas cidades e o calor torturante da altitude tinha um efeito negativo que eu tentava contrariar, antecipando um final bucólico para esta odisseia, nas serras do Quirguistão, em Aslam, com cascatas e jovens brancas e graciosas, tomando banho nuas nas águas geladas das montanhas em Aslam, nas mágicas florestas da Ásia Central.
Substituíram nesta área como duas estradas únicas existentes (uma em direção a Kashi e outra para Golmud e Tibete) por autoestradas, sem maneira nem forma de circular sem passar por camaras de vigilância, muitas vistorias policiais e portagens colocadas estrategicamente para controlar toda uma vasta região que deseja tão só e simplesmente a independência da DURA tirania Chinesa.
Acerquei-me da pior maneira possível do lago Quinghai, tinha percorrido uma distância três vezes superior à necessária para o avistar, mas foi uma felicidade grande ao ver esta enorme mancha azul-clara que eu pensava ser água doce.
Mais uma vez o meu provisório “anjo-da-guarda” apareceu: era o mesmo, sempre presente chinês gorduchinho e afável do comboio em Xining, apontou o “pin” colocado por ele próprio, alguns dias antes, nessa mesma t-shirt; era fácil não me separar dela, pois tinha comigo apenas duas particulares, a de mangas curtas que tinha vestida e outra de mangas compridas para ocasiões mais formais, jantar num restaurante, por exemplo.
Impressionou-me um avistamento de iaques pastando nas margens deste lago que parecia mar, nómadas como os seus guardiões, em coloridas tendas, de rosto e corpo completamente tapados devido a intensidade dos raios solares, alguns espreitando no fundo dos panos e todos eles vindos dos confins dos séculos continuavam iguais a si próprios.
Vi peregrinos mandando ao ar papeis com cavalinhos de vento
impressos, monges que se deliciavam quando me sentava gesticulando, no meio deles, tive encontros casuais com estrelas, dormindo na erva de vida breve mas depois vinham as angústias dos espaços preenchidos de nada
ea incerteza dos percursos sem fim, tiva a percursos de voar nas descidas dos planaltos de estepe até ao inicio dos desertos cinza ou de fazer parte das admiráveis pinturas chinesas quando as árvores nas estradas tocavam o chão e os pavões se passeavam pelas tradicionais aldeias.
Hexiang, a cidade das bicicletas e encruzilhada das estradas, 109 para o Tibete 315, para ocidente.
A segunda escolha revelou-se depois errado apesar de ser a cidade mais próxima e onde poderia ter acesso a dinheiro corrente dado que o único banco além dos serviços postais Chineses desta localidade me negarem trocar ou levantar em ATM.
Averiguei no multibanco, necessidade de seis dígitos em lugar dos normais quatro, do código secreto, na parede dos bancos em letras vistosas mostravam os cambio do euro e do dólar, mas era proibido a estrangeiros, apenas no banco da China era permitido e em mais uns prêmios certificados e vigiados pelo estado.
Avistei no outro lado das ruas, três transeuntes, um rapaz e duas jovens, pareciam estrangeiros pela lavada e porem mochilas, falavam inglês, vinham de peregrinação desde Lhasa e foi com eles que voltei a tentar cambiar euros, foi a mesma resposta, - não temos autorização para câmbio de moeda a estrangeiros.
Comecei a ficar preocupado, disse-me que na próxima cidade a cerca de 80/100 km pela estrada 315 haveria um banco com ATM onde poderia fazer o câmbio ou levantamento de yuanes em ATM.
Este acolhedor grupo de peregrinos de Lhasa aliviou-me da fome com mais uma alimentação gratuita num simpático restaurante, depois de continuar a minha viagem na direção que me indicado como sendo a mais próxima para conseguir “dinheiro”.
Jamais teria seguido pelo caminho da direita, não fosse esta emergência, mas como algures esses dois percursos entroncavam numa única via em direção a Kashi, pelo coração do deserto do Taklamakan, foi por esta que continuar rumo ao final abrupto da viagem.
Halihatu ou Haixi eram as localidades a alcançar nessa tarde na região autónoma de “país wulan”, a questão era a vencer 100 km numa tarde que já ia avançada, percorri uma maldita estrada 315 com “up grade” de autoestrada,
perguntei na portagem monumental, se poderia passar de bicicleta, falávamos por gestos, como era habitual assim como era a já banalizada foto, que os portageiros e polícias de serviço eles apeteceu tirar comigo, vinham um por um, perfilavam-se em pose e com o tradicional “V” de Vitória feito com os dedos indicador e médio espetados, triunfo o deles, fracasso o meu.
Ainda não percebo o significado deste gesto mas tornado-se trivial um pouco por todo o mundo, não creio que neste pais, tenha alguma simbologia próxima ou longínqua ao filme homólogo. ou mesmo com um outro gesto de um só dedo, neste caso o médio bem levantado, perante os agressivos e importunos apitos sem me parecer que conhecessem por aqui o alcance deste gesto.
Não me parecia muito mundano o sitio onde decidi ficar, numa placa castanha dizia: Dulan Temple
Eram seis da tarde e ameaçava chover, por essa razão fui questionado por refúgio e uma refeição quente, na pequena subida em terra batida que dava diretamente acesso ao mosteiro fui abordado por um individuo que eu julgava ser um monge sem a tradicional veste bordeaux e amarela.
Perguntei por gestos se podia dormir no mosteiro, questionou se possuía algum dinheiro e quanto ao que eu respondi que tinha muito pouco, apontou que deveria seguir a estrada e escreveu no chão a distancia até a cidade mais próxima, mostrei-lhe direcionar o céu, que ia chover e não poderia continuar
Pousou um braço sobre os meus ombros, parecia dada e sincera a ajuda e preenche-me como lágrimas aos olhos nesse momento.
Encaminhou-me para a entrada única do mosteiro onde se podia ler “POLICE” e mudando de semblante inesperadamente, mostrado que queria a minha identificação, apresentou-me um pequeno cartão, com uma estrela vermelha num canto, talvez revelando o seu estatuto na nomenclatura do estado.
Ficou de mão estendida atitude numa agressiva, olhando-me nos olhos e esperando que lhe apresentasse o passaporte.
Revise-me a mim e a toda a bagagem, entretanto, a ser rodeado de mais autoridades. todos sem fardamento, principiou um, mais jovem por usar o tradutor do telemóvel, convidou-me amavelmente para visitar o mosteiro enquanto ia fazendo perguntas, estranhamente não ultrapassámos as primeiras escadarias do templo, fiz algumas fotos deles que depois foram apagadas assim como todas, onde figuravam militares, fotos do Dalai -Lama em quadros de parede de noutros mosteiros ou material bélico e estranhas “ambulâncias” com canhões de água no topo, que circulavam nas estradas do caminho de Xinjiang.
Olhei as queimaduras profundas nos braços e nuca de alguns monges, pareciam feitas com tições ou cigarros acesos, fiz gestualmente um reparo, mas não obtive explicação, eles depressa se cobriram, golpe-me ver medo nos seus olhos provavelmente devido a minha presença.
Não obtive qualquer visita guiada, quando voltei ao austero gabinete da esquadra, mandaram sentar-me, perguntouaram várias vezes se estava sozinho, se tinha fome (nunca trouxeram comida tal como o povo Chinês) e o que fez ali… sempre com grandes gestos e uma inquietação que eu não compreendi a razão, como se fosse algum convidado inoportuno, pareciam não saber o que fazer comigo.
Examinaram o visto não pode tratar-se de falsificação.
Começou a chover e foi sob chuva, com muitos relâmpagos que me colocaram num carro, favorável-me um “Lexus” castanho, num modelo diferente dos europeus, sem matricula.
Saímos para o ATM na cidade, a fim de levantar algum dinheiro, tivo medo ao usar o cartão rodeado de tantos agentes (possivelmente da polícia) mas foi um alívio ter acesso a divisas correntes,
Sem regresso detivemo-nos numa esquadra, aí confirmei serem polícias sem uniforme, falaram durante uns minutos enquanto me olhavam pelo canto dos olhos e perguntei em inglês:
- “Estou preso?”
Responderam com o tradutor do telemóvel
- “ainda não!”
Escreveu que vindo vindo confirmar o meu visto mas um relâmpago tinha caído diretamente em cima do computador da esquadra
Por fim escreveu a jovem polícia no celular tentando ser simpático:
- “você é bom!”
Não entendi se teria havido engano na tradução, ou queria transmitir que eu era boa pessoa, com bom carácter ou apenas um homem de coragem, audácia que me faltou pouco depois.
Voltámos ao mosteiro onde a porção de polícias tinha aumentado, estavam na pequena sala cerca de doze pessoas entre fardados e não fardados, isso dividiu-me.
-sentir-me-ia apavorado ou se alguém finalmente reconheceu da minha importância.-
As atitudes tinham-se tornado mais agressivas, por cada tentativa minha para me erguer da cadeira colocada no meio desta chusma de gente era empurrado pelos ombros e reprimido, obrigado a ceder perante a violência visível nos rostos destes homens, encostavam os olhos aos meus numa postura de “posso e mando”.
De novo as mesmas perguntas, se estava sozinho etc, nesse momento entra uma jovem que me disse em inglês- não ser bem vindo em Xinjiang,
- Iria ser transportado, para minha segurança para um “hotel de turistas”,
ás minhas custas e no dia seguinte iria ser posto no autocarro para ser extraído (foi essa palavra usada) desta província.
Insurgi-me com vigor e levantei-me e ergui a voz dizendo:
-tenho autorização oficial, dada pela embaixada em Lisboa para atravessar este território, o meu voo está reservado em Bishkek no Kirguistão, esta é uma única via de acesso da China ao Quirguistão.
Não serviu de nada e só piorou a minha posição delicada, houve alguns berros que não entendi, nem a tradutora lhe apeteceu devolver-me o significado
Disse-me simplesmente:
“-Aqui governamos nós”
“-podes ir para o Tibete mas não te é permitido continuar nesta estrada em direção a Kashi ”
Sabendo eu da dificuldade de passar sozinho, sem fazer parte duma viagem organizada com“ guia oficial ”para o Tibete, restava-me voltar ao ponto de partida, a Xi'an….
Mas os imprevistos não acabaram…
(continua)
O regresso
Chovia sem cessar quando parti do mosteiro de Dulan, cerca das 23 horas, no carro da polícia, identificada e com matrícula, acompanhavam-me a tradutora e um jovem polícia fardado com afinco, ainda se notavam os vincos da goma na farda cinzenta.
Encetei uma conversa casual com uma tradutora, esta fingiu-se pretensamente indisposta, talvez para não dar azo a más interpretações da autoridade que nos acompanhava ou por não querer falar com desconhecidos, remetendo-se ao silêncio ...
O hotel em Wulan, onde obrigatoriamente dormiria essa noite tresandava a novo e parecia de outra dimensão, sofás imaculadamente brancos de nunca usados, assim como o quarto jamais utilizado, perfeitamente intacto, assim era o Inglês para o pessoal do hotel dito “turístico”.
Pediram através da tradutora o meu passaporte e o equivalente a trinta e cinco euros, pagos antecipadamente, mais uma caução do mesmo montante a qual recusei pagar, era afinal quase todo o dinheiro que tinha retirado da caixa automática, com a ajuda dos primeiros agentes de segurança , pagava caução onde era forçado a ser hospede, um rececionista olhou para o delegado da autoridade e bastou um leve aceno de cabeça afirmativo da jovem polícia para esta ignorar o absurdo deposito, ficando apenas com o salvo-conduto.
O quarto com duas camas imensas almofadadas na cabeceira em vermelho Maoísta e toda a decoração do quarto lembrava um decadente bordel.
Sentia-me perdido nos confins da China e não ousei implorar que ligassem a água quente, teimava em assomar na torneira uma gota de água, insuficiente mesmo para uma lavagem de gato.
Abri devagar uma fresta da porta para confirmar o que supunha, uma subtil presença do guarda sentado num dos sofá brancos do átrio, o quarto posicionava-se num corredor de fácil observação para o “hall”, sem outra saída que não fosse rente à minha previdente escolta, a qual achou por bem instalar-me de manhã cedo no lugar “VIP” do velho autocarro, atrás do motorista e após uma curta troca de palavras com a revisora.
Paradoxalmente sentiu-me aliviado perante um incógnita que representava a travessia do deserto do Taklamagan, por um lado desejava atravessá-lo mas por outro receava-o sem ser capaz por “leitmotif” de desistir
De regresso a Huangyuan, cidade que tinha visitado dias antes, comodamente sentado no autocarro avistei por uma última vez o suposto “Mosteiro de Dulan”, mirei os gestos e rostos dos passageiros e vi que nenhum descobrira a vista ou balbuciara os "Mantras" como estava habituado a presenciar em passagem por outros locais sagrados, admirei-me desta atitude por parte dum povo tão devoto ao Budismo tradicional.
Encontrava-me perto da fronteira Norte do Tibete, no altiplano de feição Gelugpa, (tradicionalmente conhecido por motivados) próximo das comunidades conhecidasas “autónomas“ de Uigur's, do ancestral Turquestão Oriental, dos focos de rebelião, dos separatismos e da “Primavera Árabe (à chinesa) ”, à qual a“ Grande Muralha ”não escapava, ainda que as notícias não transgredissem o" Status Quo "imposto pela asfixiante ditadura, que aos olhos dos governos ocidentais parecia mais cor-de-rosa do que encarnado vivo, mais capitalista; a prática USA já queima vender hambúrgueres e Starbucks de Beijing a Shangai.
Em HuangYuan resolvi mudar de transporte e usar o trem, foi uma tarefa espinhosa numa cidade em obras, como quase todas na China, não me corrige imitando os filhos do comboio típico, o qual esta China montanhosa nunca conhecera, passaram a época do fabuloso furgão “Tch-Tch-U-uuuuu-pouca-terra-pouca-terra” para as locomotivas elétricas e modernas, consegui finalmente que um taxista entendesse a minha linguagem gestual e colocasse a bicicleta, meio dentro, meio fora do porta bagagens, nenhum minúsculo táxi amarelo.
Voltei ao mesmo dilema na caixa do banco, esta não aceitava os meus quatro dígitos, no interior da instituição financeira não cambiavam Dólares ou Euros e era difícil mesmo mostrar o referido cartão, fazer entender uma pretensão tão simples como era encontrar o “banco da China ”A palavra Banco não funcionava e China também não.
Os Yuans eram em quantia suficiente para comprar o bilhete de comboio para regressar a Xi'an ea incerteza financeira e logística aumentava não tinha forma de regressar, o meu retorno era pela antiga Republica Russa do Quirguistão, cada dia mais e mais distante,
Dentro, a grande gare estava repleta de militares que iam e vinham do Tibete, era o centro das atenções, uma jovem próximo progresso por sinais que iria na mesma carruagem e na mesma direção, como tal fiquei descansado.
Surgiu o meu perpétuo acompanhante, aquele que eu havia agraciado com um crachá na camisola suja, havia duas semanas, tinha sempre aparecido como “do ar”, junto ao Lago Quinghai e na vila de Heimaha Exiang, onde me interpelou, de novo agora, na gare, mostrado-se ainda mais amigável, abraçou-me entusiasticamente e perguntou (aconteça fingir não saber) -porque estava regressando a Beijin, expliquei-lhe apesar de desnecessário, vi fechar-se-lhe o rosto assim que me referi à hostilidade das autoridades, demonstrava que não lhe interessavam as minhas desventuras.
Entretanto aproximou-se um sujeito magro, com cerca da mesma idade, afirmou pertencer à “Sociedade Geográfica da China”, mostrou-me uma identificação qualquer, logicamente escrita em Chinês e utilizado na minha viagem, tirámos uma foto de grupo, solicitada amavelmente para observar no meu Visa se há limitações de acesso a Xinjiang ou a qualquer outra província da China, disse não ver nenhuma.
Ultrapassado o tempo previsto para embarcar, perguntei para o relógio, à moça que anteriormente tinha afiançado na mesma direção, mostrei-lhe o bilhete, esta pedida-me desculpa e conhecida-se pesarosa pois tinha-me induzido em erro e eu havia perdido o comboio.
Por instantes entrei em pânico, sem dinheiro, nem para comer e sem transporte afigurava-se o pior, felizmente trocaram o acesso na estação tendo efetuado a viagem de quase 20 horas de regresso a Xi'an, sem qualquer alimento.
Nesta ultima cidade aumentava mais a minha angústia na dúvida de conseguir regressar, os muros não mais me pareciam históricos e belos, a cidade transfigurara-se numa prisão…
(continua)
Sobre Mim
Quinta-feira, 25 de abril de 2013, Setúbal- Portugal
Nasci em Grândola-Portugal, em 1961 a 3 de Julho, na vila que deu o mote para a canção da liberdade em Portugal, (Grândola Vila morena) nº 25 de Abril de 1974 , os meus pais trabalhavam no campo, nessa zona do país de grande proprietários tradicionais e baixos preços, decorrentes da migração para uma cidade maior e nesse tempo, mais industrial, Setúbal.
Começou o meu pai por trabalhar na montagem automóvel, um pouco mais bem remunerada mas que o obrigou a abraçar a profissão de Barbeiro, por conta própria num pequeno estabelecimento, (onde ainda hoje ainda trabalhamos, apesar deste ter 84 anos de juventude) revelou- se uma profissão mais compensatória para ambos que o trabalho sazonal no campo a que estava sujeito no Alentejo Português ou o trabalho de linha de montagem industrial e rotineira, apesar de tudo, aí era mais bem pago, mas muito duro, também eu trabalhei na industria naval embora estudasse durante a noite, pensava tornar-me num cinzento advogado de divórcios e outras causas litigiosas.
Cedo surgiu em mim o gosto pela aventura e pelos grandes espaços e foi como uma bola de neve que fui travando com conhecimento de aventureiros e escaladores assim como o primeiro escalador Português do Evereste, João Garcia com o qual conheci de Himalaia e os Andes Chilenos.
Durante os 13/14 dias em que percorri o GR 11 a pé, desde Irun não parei de pensar na próxima aventura e escapado-me apropriado que, se correr atrás de 800 km e 40.000 metros de desnível acumulado do GR 11, desde o Atlântico até Cap de Creus no Mediterraneo (apenas mais seis ou sete dias que o célebre Catalão Kilian Jonet, com metade da minha idade) como já tinha feito de bicicleta em sete dias o Caminho de Santigo Francês e cruzado em Burgette / Roncesvalles os Peregrinos que se dirigiam a santiago pelo que o mais apropriado seria cruzar de bicicleta, (por etapas tal como tinha feito estas duas travessias da península Ibérica) toda a zona continental contínua da China até ao extremo ocidental da Europa mais ou menos pelo mesmo paralelo da península Ibérica e ainda mais porque todo o fluxo histórico parecia vir desta direção,todo o comércio não só da seda mas da sede de conhecimento humano.
Talvez fosse mais sensato descer toda a América de bicicleta, com maior segurança, mas as cidades mais importantes estavam na Ásia Central, Samarcanda, Bukhara, Khiva, Urgench ou Merv e Portugal ou a Espanha tinha ditado o fim dessa rota milenar, nada mais apropriado que prestam homenagem como Caravanas e aventureiros que se perdidos nesses caminhos tal como Marco Polo e outros, sem registo nas histórias contadas junto das fogueiras dos acampamentos sob as estrelas que ainda hoje são como referidas e que me servirão todavia de tecto.
Será a primeira vez, que irei percorrer um tão grande número de quilómetros em tão poucos dias, sou Português por nascimento e barbeiro de profissão, o tempo de descanso é curto e dependo unicamente do meu trabalho, pelo que tenho de tirar partido do pouco tempo livre e fazer o máximo nesse espaço de tempo, neste caso 4.500 em trinta dias, quase a distância de Madrid a Moscou num mês, ou seja, terei de percorrer 150 quilómetros por dia sem descanso durante esse espaço de tempo.
Será a primeira etapa de um plano ambicioso em que tenciono pedalar até ao extremo mais ocidental da Europa, o cabo Sardão nas praias de Portugal no Alentejo.
Comecei por pedir a aplicação do visto para a China no passaporte (disse-me na agencia de viagens onde comprei o bilhete de avião que não seria necessário visto para o Quirguistão) demorado e burocrático foi este visto para a China ,, fazendo-me sentir como seria difícil o percurso numérico dos maiores países do mundo mas também um dos mais burocráticos.
As próximas fases serão o fazer listas o mais concisas possível dos objetos a transportar, arrumá-los e depois ir retirando tudo o que não necessariamente necessário a necessidades diárias, a roupa, -á parte das calções almofadados de ciclismo-, será comprada nos mercados locais para me parecer o mais possível com os habitantes de cada região da Ásia (cada uma delas do tamanho de países como a França a Espanha ou a Polónia)
Lembro-me, passados tantos anos de uma série de televisão que me iluminava os olhos e a alma apesar de ainda ser a preto e branco. Ah, e aquela música de Kitaro emocionava-me pela magia dos novos filhos orientais, (A Rota da Seda) Kitaro era o musico Japonês que compunha a banda sonora e teve aquela musica a faculdade de um despertar para o oriente e para a rota mítica da-seda, algo até então longínquo como hoje ainda é, as cidades chinesas e todas ao longo desta rota milenar modificaram-se entretanto mas espero ver um ultimo vestígio das imagens com que aprendi a conviver faz quase 40 anos, na série televisiva que esperava semanalmente ver no minúsculo ecrã, um aparelho ligado a uma bateria pois não possuía eletricidade em casa, isso eram coisas de meninos ricos e minha casa era no campo,
Lembro-me da inveja que tinha dos outros meninos da escola, falavam de ouvir música num gira-discos e eu nem sabia o que isso era, agora não invejo os "sedentários" dos meus colegas de turma, um deles bastante famoso, José Mourinho , mas com o qual, não trocava a liberdade suprema, de me perder na vastidão do mundo.
Talvez por isso sinta a mais afinidade com estas civilizações do mundo do fim do mundo do que com o acanhado ocidente, dito civilizado e homologado…
Há duas vias ou formas para alcançar o Ocidente vindo da China através do deserto do Taklamakan ou pelo norte via Turpan e Urumqui, ou junto a fronteira do Tibete por Golmud e yarkand, no coração do deserto de areia quente, será esse, o meu percurso , o mais possível longe dos autocarros de turistas que insistem em visitar a imponente muralha da China e em transformar como rotas da seda em mais um circo ou uma Disney, no fim do caminho Chines, estar uma cidade muito importante desta rota milenar, Kashgar onde confluem as varias vias para o ocidente e também o caminho Norte Sul para o Afeganistão e Paquistão que dava acesso a antiga cidade de karakorum na Mongólia a norte do Altai, e que ainda dá o nome a uma das mais altas passagens do mundo o karakorum pass .
Torugart pass será um dos pontos históricos mais importantes desta primeira etapa por existe um caravansary (local fortificado e refugio de caravanas durante a noite) em bom estado de conservação onde poderei sentir alguns restos da poderosa energia levou que os homens a caminhar para o ocidente.
Tenho viagem marcada no fim do mês de Junho em Bishkek no Kirguistão, antiga república da Confederação Russa e um mês para pedalar entretanto, rumo a esse destino, começando em Xi'an, berço da China atual no dia 30 de Maio de 2013.
Em 2014 Retomarei de Bishkek, o caminho até Istanbul através do Irão e do monte Ararat, o monte da fantástica arca de Noé e em 2015 cruzarei, se Deus quiser, Alá ou Confúcio a Europa até ao cabo mais ocidental, o cabo Sardão nas praias de Portugal.
Jorge Santos (namastibet@gmail.com)
http://namastibet.blogspot.com
GR 11 (2009/2012)
O Transhumante
Ou “Versus de Montanya Mayor”
Encontrava-se no Sud-express que tinha partido de Lisboa, da Gare do Oriente no meio duma tarde tolerante e quente de Junho, num primaveril sábado e embalado sob deslavado lençol, o Transhumante adormecia rapidamente, nos beliches contíguos, Hamid-o-gordo e seboso Egípcio dizia-lhe, em mau Inglês ter como destino o Cairo a partir de Paris e um estranho sujeito, muito magro de olhar desconfiado, detrás dos redondos óculos lembrava-lhe um Trotsky ou Troll diminuto e de poucas palavras embora estivesse constantemente escrevendo numa pequena sebenta sabe-se lá o quê, disse-lhe vir do Alaska. Na escuridão do compartimento apenas os focos diminutos de luz da lanterna frontal permitem descrever ao Transhumante os acompanhantes da carruagem cama, seria essa a sua luz e companheira nos momentos noturnos e negros, na sua memória pelo Pirenéu cansado, “nos versos de Montanya Mayor”. Na Primeira noite depois de se apear na suja gare, ainda de madrugada, do Sud-express, ficou em plena floresta Atlântica e viçosa, em Elizondo, num furioso bosque onde o vento não lhe deu tréguas e o fustigou, uivando como se fosse esse o último dia da sua vida, ou antes um lobo faminto rosnando e rondando durante toda a noite, soprando sobre aquele seu pequeno e frágil refúgio , bivouac azul/negro, a cor do céu e da potente tempestade que se fez sentir durante todo dia seguinte. Nesta adiantada etapa ou quartel de vida, não deveria acreditar já, nem “por’í-além” em coincidências, mas por lado contrário ainda aumentam e em muito, as expectativas pouco mundanas dele acerca dos acontecimentos que não conseguia nem queria, plácida e pacificamente explicar, o método e o conteúdo exótico dos mesmos.
O dia terminava quente e na ligeira aragem fresca que se fazia sentir no rosto e na pele dos ombros nus, um remédio que cura e que ao mesmo tempo me saudava os sentidos como numa saudação cósmica benigna e universal, tal o poder que sentia em si, vindo e direccionado da natureza, um auspicioso bem estar oriundo e inscrito no espaço envolvente e sentido em uníssono com a mente e o corpo. A caminho da montanha sentia-se cheiro a pinheiro bravo e aquele perfume a flores silvestres contagiante e inseparável da pele, de uma fragrância libertadora, como uma bênção extraída da natureza comunicando aos poros o aval, a permissão de viver que todos os dias necessitava tal como um afrodisíaco, para voltar a dar vida à vida e poder continuar correndo e andando pelos trilhos da montanha aberta.
Como é próprio da sua delicada e dedicada imaginação, constroi apocalipses e maremotos em chávenas de café mais ou menos morno, a falta de explicação de certos fenómenos iliba-o de os comprovar (excepto no generoso aroma do café) e não contesta, jamais contesta o seu voluntarioso espírito acerca da veracidade crua e volátil dos factos, trata de os preservar como num cadinho para, no futuro (refere sempre "o futuro”) os desencantar num outro universo paralelo em que façam mais sentido e encaixem magicamente, como se fossem peças de um grande puzzle.
Virou-se então para trás nessa manhã, sentindo-se miserável, fitou de relance e ao longe o mar e o lugar de onde partira e onde não voltaria tão breve, pela frente um esquisso de Pirineu recortado na neblina e bem lá no alto, o qual não conhecia na sua maior parte, alto e tosco rasgado por precipícios e gargantas, tentará desafia-lo e enfrentar o medo que sente um ser solitário e só, qualquer ser nessa estranha e primeva gesta medieval, canta inconsciente e mentalmente a "Chanson de Roland" esta não lhe sai da cabeça enquanto, decidido caminha em direcção ao Mediterrâneo e ao destino final, a casa e atelier de Salvador Dali em Cadaques, na fronteira de um outro mundo. Seguidamente depara-se-lhe Urvallo ,outra aldeia e, numa típica diminuta cabana de caça, Pako e família recebem-no simpaticamente , partilharam uma generosa refeição inundada ao bom vinho da região, que o reabilita da noite mal dormida e insta a percorrer os quilómetros seguintes e a estugar o passo, foram divertidas e relaxadas as horas seguintes apesar da humidade constante e o céu negro, havia-se instalado nele nele a confiança, a tão necessária confiança para conseguir correr cerca de 1.100 km no menor número de dias que lhe permitiam as penas e a inclinação ciclópica do terreno montanhoso. Aí encontra um holandês, directo na sua observação e que o considerou de louco , louco por cantar em alta voz as músicas partisans, como o "Bella Ciao", que melhor e mais bela homenagem poderia ele prestar a quem lutou pela liberdade e quem se poderia considerar são, naquela interminável dança, de arvoredos e pedregulhos, pensou ainda em Saramago , no “Memorial do Convento “, ele estava sim, ”completamente louco varrido, numa terra varrida de loucura.”. Viu então outra bela aldeia Pirenaica, Burgette onde se abastece para mais mais alguns km.de pistas e caminhos escuros, íngremes, encontra finalmente os primeiros peregrinos de Santiago, estes inconfundíveis, alguns de aspecto medievo; poncho, cabelos compridos, chapéus de cabedal e também emoções diferentes das dele, nessa altura ainda não partilhadas por este homem pouco dado a epifanias, pelo menos até aquele momento. Chovia de novo uma chuva monótona, cortante e constante, de mãos bem assentes e em gesto de cumprimento sobre os ombros como que o protegendo de maus espíritos, estes deixaram bem vincada nas emoções e na sua memória de transhumante, ali teria de voltar uma e outra vez, como voltara já, vidas passadas e antigas, haveria de regressar todavia no futuro.
O trilho, apesar de difícil fluía sob os seus pés e pernas e perante os seus olhos ávidos de novos horizontes, demasiado cansado, sempre rumo a mais um colo e a mais outra floresta depois de um cume árido, perigoso e pedregoso, os relâmpagos não davam descanso ao caminhante, sentia nos cabelos a electricidade circundante e o cheiro a ozone, a morte iminente sob uma faísca. Mas as tempestades têm também o seu lado belo, assim foi em Mendilaz, outra aldeia que parecia saída de um conto de fadas, sob um arco-íris de cair para o lado, nada fizera prever algo tão grandioso e belo, ainda menos perante aquelas imagem da véspera e o tsunami que, embora ele ainda não soubesse, essa noite iria cair, felizmente o “fronton”,(recinto de pelota basca) semi-coberto, evitou males maiores, conseguiu dormir seco apesar do fraco carinho que a população da aldeia lhe manifestou, mas o povo basco é assim, isolado, desagrado, desconfiado embora honrado. Enfim , Ochagavia e Isaba estavam no caminho e depois da tempestade a bonança fresca, com cheiros benignos e resinosos, acompanhou-o na respiração rápida e ofegante de caminhante feliz, os esquilos saltitavam, parecia o renascimento da primavera enquanto o Col de Somport e Candanchú se aproximavam depressa, venceu o horizonte e espanta-se que as novas vistas , sejam diferentes, ao seu ponto de vista, apesar de iguais para os demais, assim progride diariamente ,tentando ver o que está por detrás do monte, por trás dos novos e iguais horizontes, dos grandes estradões antigos e gastos, antes de começarem os caminhos verdadeiramente empinados do típico Pirinéu central, permitem-lhe estes escrever mentalmente enquanto caminha rápido, como se voasse no pensamento abstracto, o tempo demasiado calmo anuncia-lhe uma nova e sempre certa tempestade de tardes quente, sempre a hora certa, imensos esquilos fugindo, alguns veados e cavalos que quase o empurram para fora da estreita via, o céu tinge-se de negro, rugindo forte , ao som das trovoadas, “Valle do Ecco” estava escrito no mapa molhado , um vale onde nem os próprios pensamentos consegue ouvir, o eco da ancestralidade e os cascos dos cavalos que deram o nome a este rude espaço. Encontra Ascencion e Angel, tornaram-se companheiros de caminhada mas apenas por algumas horas, repartem com ele batatas cozidas mas logo ficam para trás, apesar dos angélicos nomes destes, Angel e Ascencion, não os enquadra com o local onde os encontrou, Valle do Erro (vale dos Cavalo), seria engano, estaria errado de novo, pensou que não, não como em 2007 quando se tinha perdido ali mesmo, apenas um desacertado encontro com Anjos numa floresta de druidas e magos, mais tarde logo haveria de pensar nesses estranhos acontecimentos. De novo alcança protecção, na escuridão de Isaba e pela terceira noite adormece apesar de fortes dores num pé torcido de quando caiu de uma ravina sobre um colchão de folhas podres, foi a mochila que felizmente amparou a queda, depois disso, ainda não tinha dado uma centena de passos viu (ou pensou ver) o que lhe pareceu ser “S. Miguel,” na porta de um mosteiro do século doze,como uma miragem, um aconchego para a alma apesar de não crente apesar de ter sido ele o único que tinha conseguido eventualmente ver este S.Miguel em doze séculos de caminhadas e caminhantes mas foi um sopro de esperança que sentiu na realização da difícil etapa e no na suposta finalização do percurso, coxeando muito, arrastava o corpo cansado em direcção de Zuriza e Águas Tuertas, local já bem conhecido de outras incursões, depois e porventura acabaria chegando a Candanchú, Coll du Somport, quase doze horas de marcha árdua e dura, mas pensava conseguir chegar, estava bastante animado, acordou ainda noite fechada,tinha de esticar o passo em direcção ao desfecho, iria percorrer um terreno muito mais difícil de montanha, com trilhos pouco definidos e sem mapa, já que, quando partiu de Irun, não pensava chegar tão longe, talvez, imaginava ele desistisse antes e a neve que sabia previamente existir aqui em altitude e fora de época, pendurada nos picos de Penha Forca não o deixasse progredir, agora incomodava-o, teria de atravessar com ténis de correr , uma zona de progressão mais técnica e difícil. Encontra então o derradeiro Miguel em carne osso e pele, quem sabe talvez o S. Miguel da porta da Igreja do século doze (,aquela figura dúbia que apenas a ele ,doze séculos depois do carpinteiro a talhar lhe parecia mostrar o S.Miguel estilizado na porta de madeira velha), Miguel nunca tinha pisado a Montanha tão seriamente , condutor de autocarro, resolveu uma semana antes atravessar esta rota ,assim e sem mais , nem menos… mas foi graças ao apoio mútuo que chegaram ao coll du Somport,Candanchu, Miguel continua e porventura continuará ainda caminhando, entre os caminhos dos peregrinos e outros, nos “Versus da Montanya Mayor” em busca de outros viajantes solitários ou em perigo, pensa o transhumante, ele regressará de novo em outros dias de outros Junhos , noutro tempo ( por sinal este ano de 2010 a 6 de Junho),na tentativa de chegar a Andorra ,até ao Mediterrâneo em 2011 ou 2012, e mais além….Talvez, ( porque não Istambul ?)
Jorge Santos/Transhumante
05/2010
O Silêncio do Nada
2ª etapa (Coast to Coast) Atlântico /Mediterrâneo
3 dias (Canfran/Viadós)
O dia estava morno e ventoso enquanto calcorreava as escadinhas de Alfama em Lisboa, era fim do dia, despediu-se da Phyllis, a sua companheira o do filho no Museu da água, um táxi levou-o ao aeroporto, opção que se revelaria incómoda, apesar da rapidez deste meio de transporte em relação ao autocarro habitual ou ao Sud-Express (Lisboa /Madrid costumava demorar cerca de nove ou doze horas horas dependendo da opção). Estava animado pelo sucesso do ano anterior, tinha percorrido 250 km em quatro dias e meio, ainda não tinha recuperado completamente do pé torcido (talvez nunca recuperasse), mas nada o detinha na tentativa de atravessar do Atlântico ao Mediterrâneo, desta vez começaria em Canfran, perto de Candanchú, (Coll du Somport) onde tinha finalizado em 2009, Canfranc era uma linda estação de caminho de ferro, monumento de outras épocas mas tristemente abandonada junto á fronteira com a França, esperava ainda os comboios que não mais chegariam, por estúpidos motivos políticos, eram 13:27, hora de almoçar numa pequena e antiga taberna e lançar-se montanha dentro apesar da chuva forte e da neve em quantidades recordes nas portelas e cumes, percorreria 18 km até ao anoitecer em Salent Galego, ao chegar a Fuerte Col de ladrones, uma pequena fortificação de portagem medieval, já está encharcado até aos ossos e tremendo de frio, sob a pouca roupa que tinha consigo, afinal era verão e tinha de carregar o mínimo de peso para conseguir alguma velocidade num terreno tão inclinado como era aquele com passagens pelos 2.500 metros e desníveis consideráveis, o xisto cinzento parecia fazer crescer um céu tormentoso quando chegou a Formigal, uma Dantesca estância de ski, teve de apressar-se ao sentir os típicos sinais de resfriado provocados pela neve e gelo e o esgotamento dos cerca de 20 km feitos numa única tarde e a elevada altitude, quando chega finalmente a Salent Galego entra na primeira porta de hostal e nem negoceia o preço da noite, tinha pressa de secar e dormir, a última noitada tinha-se passado esperando transporte no terminal rodoviário de Zaragoza, dando voltas à enorme estação para conseguir manter-se acordado, sabia que todo o perímetro demorava uma hora a completar, em passos lentos e foi assim contando as horas de uma noite difícil, mas era preferível ao acordar sem nada, roubado como já tinha acontecido fazia tempo num jardim de Sevilha, tinha então dezasseis ou dezoito anos e fugido de casa na tentativa de conhecer o mundo para além da Europa, tentou passar furtivamente para África, felizmente não tinha conseguido fugir ás autoridades que o devolveram a casa dos pais.
De manhã acordou pelas 7 horas, mas sai do hotel às 8 horas em ponto, com um céu limpo espelhando-se na barragem de Sallent a caminho de Panticosa, fê-lo pelo caminho mais fácil, tinha-se informado previamente da viabilidade de outro percurso mas a neve continuava intransponível, além disso este estradarão ia directo até ao balneário de Panticosa, outra aberração Pirenaica, uma estação Termal cinco estrelas inaugurada e logo abandonada, este atalho permite-lhe aumentar substancialmente a velocidade média do percurso por ser feito numa estrada e não num caminho sinuoso e difícil como a maior parte das etapas. Olha para o relógio, eram 11 horas e estava já em Panticosa, percorrera 20 km em 3 horas e esteve animado nos restantes 17 km até Bujaruelo onde chegou pelas 5 horas da tarde,a tempo da primeira refeição do dia e recuperar fôlego para os próximos 18 km até ao Parque natural de Ordesa (Cabana Suaso). Pela primeira vez encontra uma alma viva neste trilho, assusta-o o rastilhar do mato, era um corredor de longa distância que aparece repentinamente, ia na mesma direcção e mais tarde protagonizaria com ele o abandono do GR, depois de se perderem juntos em Goriz. Foi um longo dia, percorrera 56 km, já tinha anoitecido quando se aconchega frio e molhado na Cabana Suaso, cheia de centenas senão milhares de inofensivos ratos, no Parque Natural de Ordesa e Monte perdido, o pé voltou a resvalar numa pedra e foi dolorosamente que se arrastou as últimas centenas de metros e de novo sob chuva forte, a chuva constante e prosaica de todas as tardes Pirenaicas. Mas renova-se de energias no terceiro dia pela excelente paisagem de Canyons e florestas densas da zona, Goriz e Anisclo eram agora as metas e seria talvez no Refúgio de Pineta ou a aldeia de Parzan sua próxima meta, ainda não sabia ele que chegaria a Parzan sim, mas no carro de apoio do John ,o incontornável corredor de montanha que o ajuda a chegar ao final desse dia depois de se perderem e reencontrarem.
O trilho escondeu-se sob a erva muito alto, (de novo devido à meteorologia extrema do último inverno) as confortáveis marcas brancas e vermelhas desapareceram, esperando por ele mais à frente estava John, o referido colega de percurso que lhe fazia lembrar uma lebre sendo ele a tartaruga, o outro corria, e ele com algum peso às costas (além da idade que o ameaçava apesar de ser todavia Transhumante convicto) tentando deslocar-se o mais rápido que podia.
Foram horas que passaram na busca do trilho e de “Fuen Blanca”um manancial que indicaria ser por ali o trilho que desceria pela vertente, não podiam inventar, só aquele trilho os levaria ao vale e acenderia depois ao colado Anisclo, uma das subidas mais íngremes de toda a viagem.
Foi decepcionado que o Transhumante desiste do projecto pelo qual esperou um ano, saindo do percurso, alcançá-lo de novo implicava um dia de marcha e as condições anímicas não eram as melhores nessa altura para lhe permitirem retomar o caminho. Baixa para a aldeia de Nerin onde felizmente o aguarda John e o transporte que o coloca de novo na continuação da marcha, desta vez mais à frente, na pequena aldeia de Parzan, a poucos quilómetros do túnel de Bielsa, pensa que talvez assim consiga chegar a Benasques , abandonada de vez a vontade de alcançar Andorra. O Aneto, próximo de Benasques marcava a metade do percurso Gr11, costa a costa e seria suficiente neste ano ,regressaria mais tarde onde se tinha perdido para averiguar melhor, por agora estava conformado e cansado,terminou o dia com uma derrota de portugal face a Espanha no Mundial da África do Sul de 2010 e jantando na única taberna da Localidade, servido por uma imigrante do Brasil enquanto vêm o futebol final da taça do mundo, ironias do destino.
Tem 40 km para percorrer, o pé inchado dificulta-lhe a marcha, de novo Jonh passa a correr e despedem-se:-até Benasques, Pensam encontra-se novamente no final mas não conseguiria lá chegar, ao meio da tarde e feitos apenas 20 km, desiste na cabana “refúgio de de Viadós”, consegue boleia na aldeia de Plan, haveria de voltar de novo no ano seguinte, esperava ele , e com melhores condições atmosféricas, talvez com menos neve nos cumes e menos chuva nas tardes curtas.
Recorda-se do ano anterior(2009) e do Miguel ,o Santo Miguel do convento do século XII ? ou simplesmente um condutor de autocarro, este ano tinha comparecido diante dele um Deus alado, O Mercúrio determinado e com asas nos pés ,qual seria no ano seguinte o personagem que o acompanharia, tinha curiosidade em saber e doze meses para melhorar do entorse ,talvez não fosse má ideia usar botas na próxima vez, em lugar dos usados ténis , apesar destas lhe diminuírem consideravelmente a velocidade.
Em Ainsa ,depois de Plan ,apanha uma outra boleia boleia (fazia-o recuar aos tempos em que viajava de boleia pela Europa) desta vez deixa-o na estação de autocarros na cidade de Barbastro, com destino a Saragoça , Madrid e Lisboa, soube-lhe a pouco os três dias e meio no silêncio do nada (120 km) e depois aquela interminável viagem de autocarro de 900 km, mas sabe que regressará no ano seguinte, por agora resta-lhe voltar a Burgos para finalizar de bicicleta o “caminho de Santiago” a Finisterra, 600 km de trilho e ele ainda pode pedalar,o movimento dos pedais não o incomoda demasiado,como treino tentará fazer a estrada mais longa do país - N2 com cerca de 800 km de Faro a Chaves ou ao Cantábrico,tão distante para alguns mas tão perto para ele, pensa no seu amigo Idílio,( http://bacalhaudebicicletacomtodos.blogspot.com ) a pedalar do pólo Norte ao pólo sul e como gostaria de o acompanhar ou talvez não,está tão habituado a estar só que encara como natural esse estado,esse silencio…esse nada…
Jorge santos
http://namastibetphoto.blogspot.com
Junho de 2010
Transhumante Parte 3 (Diário de um Louco)
Os primeiros orvalhos do Outono já se faziam sentir nas planícies madrugadas de Espanha e vestiam-se de ruivo nas espigas e nas vistas da janela do comboio/Hotel Lusitânia. O Transhumante despertava de uma noite mal dormida em solavancos e guinadas para mais uma etapa nos Pirenéus, depois de chegar a Madrid ainda teria de percorrer outras estações e outros comboios mais modernos e rápidos que o levariam até onde tinha terminado no ano anterior, em Ainsa, S. Joan de Plan/Biadós.
Um táxi colectivo despejou-o já noite, no fim da estrada de alcatrão que tão bem conhecera no ano anterior (2010), sabia a distância que iria percorrer a pé até ao refúgio, (cerca de vinte quilómetros) mas não se estaria aberto dada a proximidade do inverno e, para aumentar a incerteza não tinha comida para essa noite nem tinha alimentos para se lançar nos caminhos costa a costa do GR 11.
Ainda ponderava na lucidez do seu estado mental e no que o levava a fazer este disparate de atravessar os Pirenéus do Atlântico ao Mediterrâneo quando as luzes de um veículo-todo-terreno iluminam a estrada, iam na mesma direcção e tinham uma valiosa informação – O refúgio estava aberto -já tinha transporte e também onde “sennar” e dormir nessa noite, começara bem esta aventura de loucos.
Acordou “com as galinhas”, mal se avistava já os caminhos ténues da montanha mas felizmente o bom tempo presenteava ainda um doce fim de Setembro que mais parecia primavera e nas pernas do Trashumante, as primeiras horas decorreram gloriosas, corria como um louco, esquecera tudo quanto deixara para trás, respirava o silêncio do nada numa terra inundada de loucura.
Recordava as manhãs longínquas de quando iniciou dois anos antes em Irun esta rota e lhe parecia estar tão distante do final, no Mediterrâneo em Cap de Creus, mas afinal já tinha feito metade, estava agora percorrendo a parte média ou central, mas também a zona mais alta da cordilheira Pirenaica, onde as tempestades poderiam ser mais perigosas e as etapas mais dolorosas com desníveis consideráveis(entre os 900 e os 2.700 metros).
Conhecia grande parte destes lagos de montanha e parques naturais paradisíacos, melhor que o resto da cordilheira, mas durante todos os anos que deambulou por aqui, nunca imaginara que pudesse passar um dia correndo de Norte a Sul ainda menos como lobo ou urso solitário, quase sem roupa para mudar, sem comida para as jornadas nem apoio logístico ou mesmo transporte próprio para fazer, depois de terminadas as jornadas, os 1.100 km que separavam a montanha, do conforto da casa e da família, da normalidade.
Era uma rematada loucura estar correndo os 800 km da rota Pirenaica não sendo um habitante local, habituado e melhor conhecedor da região, para estes bastaram sete dias, como lhe disseram ser o “record” da travessia, mesmo assim estava determinado a usar apenas 12 /13 dias, talvez poucos o conseguissem.
Na porta do refúgio de Estós, num papel escrito à pressa, dizia que o guarda voltaria próximo do meio-dia e meia hora, tentaria almoçar mais tarde, apesar do estômago já o avisar, esperava não perder o trilho ou perderia também a refeição do dia.
Quando descia o interminável valle de Estos interrogou uma família de camponeses locais que se encontravam colhendo “setas” (cogumelos), perguntou se estaria na direcção certa para Andorra e mais uma vez ficou desassossegado perante a resposta, segundo eles estaria completamente fora de rota e era uma loucura aventurar-se assim em distâncias tão absurdas e sem saber onde estava nem por onde ir, diziam eles que Gr 11 eram todos os GR’S, pois todos tinham o mesmo nome GR 11.1, GR 11.2 etc.
Revelou-se mais uma vez ser desnecessário pedir informações a quem não entendesse as razões de outros para quebrar as próprias peias mentais.
A meio da tarde um oportuno “camping” ainda aberto nesta época, junto da estrada principal que conduz a França pelo túnel de Bielsa, proporciona-lhe a tão desejada refeição com cerveja para pacificar a sede, já se faziam notar no céu as nuvens negras da trovoada que aí vinha.
Uma Estrada larga e monótona conduz-lo durante toda a tarde a uma portela que tardava em chegar até que, pelas 17 horas encontra duas jovens moças, Ivone e Elena a porta de um refúgio não guardado, acompanham-no e ajudam-se mutuamente a superar o medo da tempestade e dos sonhos em que um urso dourado, o devora devagar até de madrugada.
Tal como noutra etapa em que Miguel, o S. Miguel “da porta do convento”, foi um considerável apoio depois de um pé torcido, aqui Ivone e Elena, tiveram também um efeito reconfortante perante uma noite feita dia com os “flashes” de tantos e tantos relâmpagos apenas com um mero segundo entre a luz e o som, nos intervalos via aparecer perfilados “hobbits“ ,”brujas” e outras personagens surreais.
O dia seguinte ainda seria mais alucinante que a noite, o ar estava límpido como sempre fica na bonança depois da alguma tempestade e a correria pelo monte abaixo embriagava-o, o vento fustigava-o no rosto transpirado e continuava a correr indiferentes às dores nos joelhos, as bolhas nos pés, ao cansaço de todos os músculos, alguns até que nem ele sonhava existirem.
A meteorologia adiantava neve para os próximos dias em cotas acima de 2.500 metros e ele tinha de ser rápido pois apenas teria o dia seguinte para chegar o mais próximo possível de Andorra.
Tentou alcançar o refúgio de Colomers, já seu conhecido mas em vão, ao chegar a “Restanca”, de novo os guardas do refúgio o tentam convencer do perigo grande que é continuar, de noite e sob a tão terrível tempestade regressada novamente durante a tarde e num caminho mal balizado nessa zona. Ele convence-se a deixa-se ficar perante uma promessa de jantar, cama seca e do primeiro banho em muitos dias.
Mais uma vez acorda com pesadelos, noite cerrada, para tentar fazer render o último dia antes do nevão, das pistas de montanha ficarem tapadas pela neve. Surpreende-se da forma física que tem aumentado desde que chegou e vontade anímica de correr por entre os caminhos tortos dentro do parque de Saint-Maurici/Encantats.
Chega a Espot ainda cedo, resolvido a não continuar mais além, o céu prometia neve mas sentia a sensação “Dulce” de dever cumprido. Andorra era já ali ao virar, no total das 3 etapas tinha percorrido 2/3 dos 840 km que separavam o Atlântico do Mediterrâneo pelo trilho do Gr 11, recomeçaria no próximo ano por Esterri D’Aneu, agora já por Barcelona/Manresa, mas de avião, a viagem de 24 horas comboio/autocarro para superar os 1.100 km entre casa e o objectivo era mais cansativa que a travessia da montanha grande.
Tinha um sonho por realizar entretanto, pedalar 13.000 km de Xi’na a Istambul por entre etapas e alucinações, desertos e visões de outros mundos mais ou menos paralelos.
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Jorge Santos (09/2011)
Fantasmas e javalis ou um poema de longo curso
Dormira acarinhado pela noite amena, ali próximo, a poucos quilómetros de Andorra, agora era acordado pelos grunhidos dos Javalis, o Transhumante assustou-se ainda um pouco mas não demorou muito a lembrar-se onde estava; voltara ao GR 11 para tentar terminar o que começara quatro anos antes, no ano de 2009, em Irun .
Dava agora mais valor que há anos atrás às pequenas ocorrências diárias, talvez a falta de acontecimentos o fizesse valorizar mais os sons os cheiros ou os encontros casuais com os escassos caminhantes ou montanhistas.
Actualmente encontrava-se no Valle de Madriú, muito perto de Andorra e à sua volta os javalis esforçavam-se por manter o terreno chafurdado como era seu hábito.
Demorara cerca de cinco horas desde a partida de Lisboa em avião, fez escala em Barcelona na manhã quente de sábado,15 de Setembro de 2012 e ainda fazia calor apesar de cair a tarde, estava um calor abafado e sem vento quando chegou a Andorra de Autocarro, tempo apenas de comer no primeiro bar de comida rápida, ainda tentou recomeçar onde tinha finalizado em 2011,em La Guingueta D’Aneu, mas em vão, o próximo bus apenas seria na segunda-feira, dois dias depois.
As grandes cidades não lhe despertavam muito interesse, mesmo aquela magnífica “Babel” com as torres de Gaudi.
Lembrava-se bem do vale de Madriu, isso sim, já tinha passado por aqui com um amigo o J.J. Portela há bastantes anos atrás, mas ainda se recordava d’alguns pormenores do percurso, onde tinha tirado uma ou outra fotografia, dos lugares e fontes onde bebera uma boa água, cristalina como diamante, lagoas de azul-turquesa, lembrava-se todavia das montanhas que não mudam muito, mudam-nos a nós…e muito essencialmente por de dentro.
Uns grupos de escaladores Catalões (pareciam escaladores pelo aspecto) na cabana “dels esparvers” recomendam-lhe de uma forma pouco simpática que procure outro refúgio pois aquele encontra-se lotado, a resposta foi igualmente fria e este disse-lhes que não precisava de tecto para dormir, qualquer recanto da floresta seria a sua casa nos próximos dias.
Perguntaram-lhe o que estava fazendo ao que o Transhumante respondeu que tencionava acabar o GR 11 em quinze dias; a resposta foram gargalhadas, pois que isso não era possível já que o ídolo da Catalunha e quiçá mundial e amigo pessoal destes, Kilian Jornet o havia feito em sete dias e os quinze, seria até mesmo assim impensável, até para um fantasma e os Pirenéus estavam pejados deles…de fantamas e intrujões.
Ficaram mais aliviados quando lhes disse que todos estes Quilómetros, os estava fazendo mas em suaves etapas anuais.
Era noite quando alcança finalmente o refugi Engorg’s e acende uma fogueira, cerra a porta e deixa-se adormecer pela segunda noite na montanha alta.
Mais uma manhã magnífica fá-lo lembrar que o tempo estável em montanha não pode durar muito, sabe que em breve terá borrasca e ele está demasiado exposto aos elementos e sem qualquer apoio para menosprezar a segurança.
Pernoita no enorme mosteiro do vale de Núria, chega muito tarde e cansado ao meio de muitos turistas que o miram de alto abaixo, tinham subido no trem de cremalheira desde Queralbs, estavam limpos e perfumados ao contrário dele, mas o banho merecido limpa-lhe a alma e é um novo Transhumante que se faz ao caminho na manhã seguinte por um caminho denominado “via dos engenheiros” onde o perigo espreita bem lá no fundo da falésia, tinha de não olhar para baixo.
Nesse dia um sol admirável e uma madrugada mansa, limpam-lhe a mente e o caminho até Malnu (onde viveu Kilian Jonet) alcança Puigcerdá mas não consegue chegar até planoles nesse dia, planeava dormir num camping aí existente mas de novo encontra lugar entre os seus amigos javalis no Bivoac “azul – cor-de-tempestade” mas numa benévola floresta de pinheiros e acácias recordava-se do trajecto de outros anos e das tempestades nesta serrania que podem assustar o mais arrojado dos homens e mesmo os Transhumantes não estão a salvo dos fantasmas do medo.
No dia seguinte, entre Dorria e Planoles mais um encontro, desta vez com um caminhante sobrecarregado, pergunta-lhe o Transhumante da razão de ir tão pesado; a resposta foi imprevista, disse-lhe que iria passar muitos meses na montanha fazendo o percurso inverso dele, começara em Cap-de-Creus e iria terminar não em Irun mas noutro lugar da península Ibérica , talvez Finisterra ,ou Núxia através do Caminho de Santiago francês ou mesmo Lisboa ou Faro, perguntou ao Transhumante qual a sua opinião sobre o melhor percurso, este disse-lhe que pelas Astúrias, o chamado “Camiño del Norte”, seria uma melhor opção pela a beleza da paisagem embora de inverno fosse de muito difícil progressão devido à neve e nevoeiros intensos.
Depois de Almoçar bem em Planoles num bom restaurante ( o referido camping estava fechando)ainda consegue alcançar Núria no fim de dia, corre atrás do sol que teima em esconder-se por detrás dele e projecta uma sombra de onde não consegue sair por mais que corra, e que suba naquele horizonte árido e maravilhoso, estava junto ao ponto mais alto da catalunha “o Puigmal” ,o ponto mais elevado do, possível mente mais jovem país do mundo,”A Catalónia” ou Catalunha. Para os “amigos”.
Distingue-se ao longe uma primeira grande massa escura de nuvens, como que atraídas por ele, espectros negros que o perseguem vindos de outras épocas de guerras civis, Hemigway’s e contrabandistas.
Para o trasnhumante, assim como para os fantasmas não havia fronteiras nem parerdes, a vida fluía e era como um poema de longos discursos com ele mesmo…e com os emboçados fantasmas.
Ao fim da manhã estava em Setcases com os sinais de tempestade mais próximos, mais tarde resolve sentar-se com os velhos e velhas na taberna da aldeia, conversam sobre rituais antigos e praticas de transumância há muito abandonadas mas que não esquecem pela liberdade que usufruíam na montanha.
Dizem – lhe também ser muito perigoso continuar naquelas condições, contam-lhe do ultimo inverno em que morreram de frio num mesmo local onze alpinistas no mesmo percurso que ele iria iniciar, ainda tenta durante a tarde continuar, mas regressa à cavaqueira de café a as historias da transumância até cair de cansaço numa cama de “hostal” no virar da esquina
Foi calorosa a separação, com os velhos transumantes que de manhã cedo estavam pousados no mesmo sítio no mesmo sonho e começa, já em passo de corrida o que até aí tinha feito em passo rápido, confiava mais no pé direito que tinha torcido um ano antes e muitas vezes torcia com dores terríveis mesmo enquanto corria ou andava simplesmente a pé, depressa chega a aldeia de molló.
Depois foi Beget com uma linda igreja Românica e Albanyá foi o próximo ponto de passagem com Sant Aniol d’aguja no centro de uma vegetação tropical e uma humidade de cem por cento, de perder o fõlego, mas recupera-o depressa a poucos quilómetros de Albanyá, na vertiginosa descida duma interminável estrada de cimento, é quando vê pela primeira vez o Mediterrâneo, pondera ainda se não terá chegado a hora de terminar aquele sofrimento físico, segredam-lhe de manso no ouvido para continuar mas ele inutilmente mira sobre o ombro tentando ver sombra ou espectro mas nada, apenas a floresta, agora bem mais seca e amarelada pelo inicio de Outono.
Almoçou na casa de um camponês que escrevera na porta em letras toscas “servimos bebidas e refeições”,
Regara bastante bem a “botifarra,” o feijão branco e a salsa com um bom vinho caseiro, sentia-se tonto quando passou por ele,pouco depois um casal de ciclistas (faziam o percurso contrário tentando chegar a Irun num percurso por vezes paralelo quando não o mesmo, mas mais propício para bicicletas de todo o terreno ) perguntam-lhe se estava bem , sim; respondeu :
-estava melhor que nunca e continuou sorrindo de satisfação enquanto se afastava cambaleando em direcção ao “mar-do-outro-lado”.
Era tarde de quinta-feira e o voo de regresso seria no domingo seguinte, bem cedo; havia que fazer concessões e em boa hora o pensou porque uma boleia para Lançá o deixa mais confortavelmente próximo de Cap-de-creus e do destino, do ponto de encontro com os ancestrais que o perseguiam desde Irun, desde que começou caminhando no mar-de-cima.
Compreende agora por que razão este foi o ponto de encontro escolhido, a paisagem é torcida e retorcida, esburacada até, pelos ventos e marés, criando uma súbita catarse de estilos e sentidos que não tem igual no mundo,
Lembrou-se de uma frase de Platão, “só os mortos conhecem o fim do mundo” e aqui parecia-lhe o mundo do fim do mundo e perguntou-se: -“se não estaria morto”.
Em Port-de-La-Selva conheceu um simpático casal que o acompanhou, falavam demais e interromperam as conversas que vinha fazendo consigo mesmo, ao longo do caminho todo desde Irun,
Sentia-se incomodado mas deixou correr os acontecimentos, afinal era assim que decidira viver, como Trashumante, ao sabor do ar e das torrentes do tempo, domando criaturas e paisagens. Umas mais rústicas e pacatas e outras mais céleres e aladas como aves gritantes.
Foi um individuo aliviado que chegou finalmente a Creus e a Cadaqués a povoação escolhida por Dali, Picasso, Gaudi e muitos outros para tertúlias sazonais.
Sentia pouco profundo, o apenas ter feito um trilho comprido, nada mais, apenas um comprido e inestético poema sem métrica.
Os fantasmas não compareceram ao encontro, ficaram pelos montes com medo da “tramutana” (vento norte desta latitude que afasta as tempestades vindas do Pirinéu Catalão) esperava senti-los mais próximos da pele noutro continente, em Xi’an, quando iniciasse a rota da seda em bicicleta ou talvez nas tempestades de areia do deserto do taklamakan, que costumam soterrar estradas, caminhos e viajantes oportunistas.
Provavelmente o Transhumante ficaria nos Pirenéus e regressaria de novo a Irun ou Hendaye pelo mesmo trilho mas agora a sós, não me agradava a ideia de voltar a percorrer com ele outra e outra vez o mesmo cenário os mesmos calhaus e precipícios e os mesmos sonhos extintos.
Prestou ali mesmo, no farol do cabo de Creus, homenagem aos homens que conduziam o gado dos pontos mais altos dos Pirenéus no inverno até as planícies da erva, “os Transumantes “, A transumância foi uma prática há muito finda, para dar lugar a uma mera indústria turística que flagela as encostas desta soberba serrania com um excesso de pistas de esqui e uma paisagem lunar de dar medo até a um Transhumante, como tinha orgulho em se considerar …( EU TE SAÚDO TRANSHUMANTE )
Jorge Santos
(Setembro 2012)
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Joel Matos
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poema de Joaquim Namorado –
Dizia ele “Que quanto mais me afundo
maior é a minha ânsia de salvar-me!”
Este país é o meu “interior” país que quero “salvar” do afundamento parcial ou total, por isso peguei numa frase do Miguel Esteves Cardoso “passo do amor à política por amor ao meu país”
Dizia ele no texto,
– O preço da pressa -“O tempo, a ocasião e a sorte parecem ser coisas parecidas – mas são coisas muito diferentes. O ponto de vista, conforme o lugar onde se esteja e de onde se veja, importa mais do que o sentimento ou o juízo.
É sinal de ser-se feliz achar que o tempo nos foi roubado e que é pouco o tempo que tivemos e pouco o tempo que nos resta.”
Por essa razão coloco o país na minha alma profunda. num pais interno e sublimado em demasia assim como o tempo para a redimir ou salvar, essa coisa tão privada e particular, não permanente como se fosse um veleiro a passar,
” O castigo de ser feliz é o tempo passar depressa. O castigo de ser triste é o tempo não passar. A recompensa de não conseguir ser nem triste nem feliz, permanecendo indiferente, é o tempo passar devagar. Se todos os dias nascemos – os que temos a sorte de amar, mais a suspeita de sermos, talvez, amados – todos os dias morremos cedo de mais.”
Do ponto de vista deste timoneiro e capitão pouco mais há a dizer..
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